Eriksson e S.L.Benfica – A procura de uma identidade

Maio 13, 2008

Sven-Goran Eriksson será tudo indica, o próximo treinador do Sport Lisboa e Benfica. Passados quase 26 anos o destino do sueco está prestes a cruzar-se novamente com o do “gigante adormecido”, o clube das massas, o desgastado glorioso. Impõe-se a reflexão crónica. Que Eriksson é este que se sentará no banco de suplentes encarnado? Que Benfica é este que o sueco irá encontrar pela frente? Para as duas questões a mesma resposta. Nem Eriksson é o mesmo, nem tão pouco a águia se encontra com a saúde de ferro de há duas décadas atrás.

 

Sven tem hoje 60 anos sublinhados por uma face algo enrugada e um cabelo próprio da idade. Na mala traz alguns títulos conquistados na Suécia, em Portugal e finalmente por Itália, onde construiu o seu nome. O mesmo é dizer que desde 2001-02, aquando da sua passagem para seleccionador Inglês, que o treinador sueco não sabe o que é ganhar. Há sete anos que Eriksson vive na saudade de alcançar o êxito outra vez. É neste contexto que Eriksson e Benfica se encontram em rota de convergência. É uma espécie de reatamento de um namoro antigo. As pessoas mudam, os clubes também. Uns evoluem, outros regridem, outros entram em marasmo desportivo e económico. Por mais que se queiram aproximar e reatar um relacionamento, as diferenças entre ambos podem ser incrivelmente profundas. Resta saber se Sven-Goran Eriksson ainda tem aos 60 anos, força e acima de tudo motivação para procurar reestruturar um clube, devolver-lhe a ambição e restituir-lhe uma identidade diluída no tempo e esmagada pela frenética gula de terceiros. Ou por outro lado se é Portugal um escolha meramente tropical, de boa comida e vida boémia apetecível, um paraíso para pré-reformados financeiramente bem acolchoados.

 

Se o sueco aterrar em Lisboa com a mesma mentalidade que doutrinou aquando da sua última passagem pela Luz, o Benfica poderá estar relativamente descansado. Contudo, caberá á direcção do clube encarnado, satisfazer as exigências de Eriksson no mercado de transferências. E bem sabemos que se há coisa que Eriksson não prescinde é de milhões para contratar e milhões para receber. Ora milhões são também itens que não rimam bem na luz. Na fenda das indecisões poderá estoirar um novo divórcio assente na insustentabilidade de governar um clube sem estratégia de fundo, de forma meramente superficial, confiando o destino exclusiva e cegamente nas mãos de (mais) um D. Sebastião. É Eriksson o eleito para surgir numa manhã de nevoeiro.

 


Emoção vale o desconforto?

Novembro 23, 2007

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Se é verdade que possuímos estádios que custaram investimentos megalómanos, onde na maioria deles impera a funcionalidade e o conforto, não é menos verdade que em muitos recintos do futebol nacional a comodidade está longe de ser a desejada, e quanto ao entretenimento, esse, só mesmo o próprio jogo nas quatro linhas.

Nevoeiro e frio, daquele frio que já se reveste de contornos de Inverno, não impediram que cerca de quatro mil aficionados – não havia números oficiais da parte da FPF – rumassem, embrulhados em cachecóis lusitanos, ao Estádio Municipal de Águeda, para ver a Selecção Nacional de Sub 21 empatar com a sua congénere inglesa a uma bola. Por mais que as presenças de João Moutinho – de quem Scolari abdicou para a jornada decisiva dos AA -,   Paulo Machado ou Vieirinha pudessem motivar um público que vive ausente do convívio com o estrelato do futebol nacional, o horário tardio (21 horas)  –  totalmente incompreensível para um dia da semana, algo que só se verifica porque a RTP tem de transmitir o jogo, por constar no designado serviço público, e uma vez obrigada a fazê-lo, a televisão estatal “desvia-o” do horário nobre do “Telejornal” -, as baixas temperaturas e a falta de condições oferecidas pelo estádio e pela organização pesam de forma significativa e reflectem-se nesta como em outras paupérrimas assistências.

Não existe uma cafetaria, um espaço mais requentado, onde se possa enganar a fome ou aquecer as gargantas e o estômago. Apenas uma tábua de madeira a fazer de balcão. Servem-se sandes do mítico leitão e gélidas cervejas em copos plásticos, quem disse que vender álcool nos estádios era proibido? Nas pequenas terriolas vale tudo. Era como se estivéssemos num domingo à tarde a assistir a um aguerrido desafio entre o Águeda e o Estarreja. Mas, não. Era uma partida da UEFA, com o cunho organizativo da FPF. Para completar o idílico cenário de um domingo soalheiro de bola, só faltava o sol a aparecer entre as nuvens, substituindo o nevoeiro, e a bela da castanha de Novembro. O resto lá estava. Em vez dos assobios de Leiria, houve os sempre engraçados impulsos populares. Ali não houve claques organizadas. Houve gritos dispersos pelas bancadas. Ouvia-se “vai Moutinho”, ou “vai Portugal” quando a bola circulava pelos restantes 10 elementos da equipa das quinas.

O futebol veio a Águeda, e Águeda deu aquilo que tinha para dar.


Champions “por um canudo”

Novembro 7, 2007

Na Champions há um imperativo que se impõe para as formações que ocupam o vestiário do visitante. Eficácia. Num ambiente adverso, intenso, com a equipa da casa a vir com tudo é necessário sangue frio, espírito de sacrifício, personalidade e astúcia para se desferir o golpe fatal precocemente, “congelando” assim o adversário. O Benfica teve em mãos o destino do jogo, enjeitou-o, o Celtic Park agradeceu.   

Cardozo numa noite para esquecer

Noite de gala, ambiente frenético, casa cheia no “teatro dos sonhos” escocês com 60 mil almas a empurrarem a equipa de Glasgow para a frente do marcador. Eis o cenário pintado à equipa de Camacho em jornada decisiva.

Com um meio campo robusto composto por Bynia e Katsouranis numa primeira linha de embate (e construção), Rui Costa a servir de elo entre sectores, Rodriguez deambulando entre alas e Maxi Pereira fechando o corredor direito, dando cobertura a Luís Filipe para subir no terreno, o Benfica preocupou-se sempre em manter superioridade numérica onde se ganham os jogos, e entra em campo praticando bom futebol, de pé para pé, à boa maneira latina, rendilhando os escoceses, jogando no seu meio campo, recuperando as segundas bolas ainda na zona de construção dos “católicos”. Aproveitando por um lado a fraca intensidade de jogo inicial dos visitados, e por outro a confusão na ocupação de espaços e na marcação à zona feita no centro do terreno, pelo quarteto McGeady, Hartley, Brown e Jarosic, a formação lisboeta acelerou o ritmo de jogo, executou simples e por três ou quatro vezes teve nos pés (desinspirados) de Óscar Cardozo oportunidades flagrantes para se adiantar no marcador. Era necessário concretizar, o tal killer instict pedido aos homens da frente. Tal não veio a acontecer. O Celtic corrigiu posições, e mercê do seu futebol amplamente físico, de predominância aérea, foi aos poucos encostando os portugueses ás cordas, criando posteriormente algumas ocasiões para facturar, valendo ao Benfica o acerto e a tranquilidade de Quim. A equipa de Camacho ia respondendo com Rui Costa a pegar no jogo, lançando Rodriguez pela esquerda e Luís Filipe pela direita na tentativa de municiarem o solitário Cardozo. Faltavam opções ao Benfica na frente de ataque, gente capaz de receber a bola de costas para a baliza, de tabelar ou de aparecer no limite do fora de jogo, em aceleração rumo ao golo. Faltou um pouco de Miccoli no apoio ao ponta de lança.

Quando todos se preparavam para rumar às cabines, a tenacidade escocesa materializa-se em golo, fruto do acaso diriam alguns, eu fico-me por fruto do trabalho e da ingenuidade dos encarnados directamente ligados ao lance do golo, que sabendo da apetência dos britânicos para procurarem constantemente diagonais na “zona de tiro”, descaindo para o centro, taparam-lhe a linha oferecendo-lhe o ouro, que é como quem diz, a entrada da área para fazerem porventura aquilo em que são especializados, rematar à baliza.

Na segunda parte o Benfica sentiu o golo, baixou os índices de intensidade com que tinha jogado no primeiro tempo, foi camuflando o défice físico gradual com a estratégia típica de quem está sem soluções, passes bombeados pelo ar contrariando a natureza do seu homem mais avançado.

Di Maria, Bergessio e Nuno Gomes nada trouxeram à equipa. Aí talvez coubesse a Camacho manter Cardozo, adicionando ao jogo Nuno Gomes, fazendo entrar Di Maria para as alas, retirando do jogo a bravura de Maxi que não chega para esconder o seu défice técnico sobretudo quando actua uns metros mais à frente no terreno de jogo.

O jogo não terminaria sem que Bynia (que tinha estado em evidencia no primeiro tempo impondo-se nos duelos físicos) protagonizasse um lance arrepiante. Agrediu intencionalmente um colega de profissão arriscando-se a pena severa por parte dos órgãos competentes. Para bem do futebol, e do próprio agressor, um castigo longo seria mais do que merecido.


Dragão chora no poste das lamentações

Outubro 27, 2007

Deparei-me com um fenómeno berrante em pleno Vélodrome. Sentei-me no sofá, não descolei os olhos do ecrã durante mais de 90 minutos mas senti que a minha visão me ceifava o raciocínio a cada minuto. Algo não batia certo. A equipa de arbitragem constava. A de Jesualdo também. A terceira não esteve em campo. Subiu ao relvado para fazer um golo e esgueirou-se com o rabo entre as pernas para o subsolo mais próximo. Nada havia a fazer. O dragão não tem sangue, tem classe, não respira oxigénio, inspira maturidade. Engoliu o Marselha durante todo o combate. Resultado? Voou para a invicta com uma anedótica ferida e consciente que tudo fez para sair ileso.

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A qualidade deste Porto surpreende-me a cada instante. Se fosse um homem, seria um doutor na casa dos 40, inteligente, astuto, sóbrio e com relativa experiência de vida que lhe permite fugir aos problemas de forma simples e quase desprezável, longe dos sustos e embates constantes a que os mais novos estão sujeitos. O Dragão é assim. Não evidencia problemas. Cria soluções.

Confesso que esperava um jogo bem mais equilibrado. O Marselha lidera o grupo, ganhou em Anfield Road, jogava em casa, e tudo tinha para encantar os seus adeptos com uma exibição vistosa. Contudo, uma entrada voraz em campo por parte dos “azuis e brancos”, cedo convenceu os franceses que aquela não seria a sua noite. Em 20 minutos de jogo, o F.C.Porto faz 6 remates à baliza da casa. Dois deles, protagonizados por Meireles, selaram a trave à guarda de Mandanda. O Marselha respondeu com… 0 remates. Confrangedor diria. A cilindrada deste Porto não deixou margem de manobra ao motor a vapor gaulês. Com um trio fortíssimo no meio campo (Lucho, Meireles e Assunção mais recuado) embatendo de frente com a concorrência, aniquilando-a, e projectando a equipa para diante, facilmente se adivinharia uma vitória bem folgada. Com um fio de jogo descomplexado, pressionando alto, defendendo forte e sem hesitações, com pulmão para jogar mais uma hora, o bloco nortenho jamais cederia.

Porém no futebol não há certezas, e muito menos justiça. A anedota do mês consumou-se. Caído do céu o golo encontra a bota do atacante Niang, estavam decorridos 69min. Mas a toada do encontro manteve-se. Quaresma pela esquerda, Postiga pela direita (rendendo Mariano) e Lisandro ao meio continuavam o massacre às redes marselhesas. O mais que esperado golo portista surge por Lucho, aos 78 min. na cobrança de uma grande penalidade, que veio trazer ao jogo alguma verdade. E digo alguma, porque não fosse o desacerto na finalização e a dez minutos do fim o Marselha podia estar a braços com uma embaraçosa goleada.

Quem assistiu ao encontrou terá ficado com uma certeza na mente. Este Porto tem tudo para seguir em frente no grupo e para dar que falar no “mata-mata” que se segue. A ver vamos onde cairá o Dragão e se cairá.